Justiça nega efeito suspensivo e mantém falência da Shefa

Pedido de recurso foi feito pelos antigos gestores da empresa, que foram afastados após vários indícios de fraudes. Na decisão, desembargador considerou o funcionamento temporário da companhia. Sede da Shefa em Amparo
Heitor Moreira/EPTV
EO
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) negou um pedido de efeito suspensivo e manteve a falência da Agropecuária Tuiuti S/A, responsável pela administração da Shefa, uma das principais empresas de laticínios do país.
O pedido de recurso foi feito pelos antigos gestores da empresa, que foram afastados pela Justiça após vários indícios de fraudes no processo de recuperação judicial.
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Na decisão, o desembargador João Batista de Mello Paula Lima afirma que não há “urgência para concessão do efeito suspensivo”, já que a companhia pode manter a atividade empresarial, agora sob o comando de uma gestora judicial.
“Não se verifica, outrossim, pelo momento, a necessária urgência para concessão do efeito suspensivo, tendo em vista que a decisão recorrida ressalvou a continuidade provisória da atividade empresarial até sua eventual liquidação em bloco, nomeando provisoriamente gestora judicial profissional”, diz trecho.
O g1 não conseguiu contato com os antigos gestores.
A Shefa
No mercado desde 1976, a Shefa é uma das principais empresa de laticínios do país. Veja abaixo dados sobre produção e faturamento da Shefa:
🥛 O que e quanto é produzido? Segundo o novo gestor judicial da empresa, Frank Koji MIgiyama, a Shefa contabilizou 7 milhões de litros de laticínios produzidos no último mês de junho. Com essa média, em um ano, a empresa produziria em torno de 84 milhões de litros.
Entre os principais produtos, estão leite, sucos, bebida láctea, creme de leite, achocolatado em pó e alimentos à base de soja.
🐄 Está entre as maiores? Como efeito de comparação, em um ranking das 14 principais marcas de laticínios do Brasil divulgado em maio pela Associação Brasileira dos Produtores de Leite (Abraleite), a 14ª foi a DPA Brasil, que captou 97,2 milhões de litros de leite em 2022. A líder é a Laticínios Bela Vista, com recepção de cerca de 1,5 bilhão.
Apesar do número mais recente da Shefa, o novo gestor afirmou que a empresa tem capacidade para produzir até 30 milhões de litros por mês. Com essa quantidade, a Shefa figuraria em 9ª no ranking da Abraleite.
💰 Qual é o faturamento? De acordo com o gestor judicial, o faturamento da Shefa gira em torno de R$ 40 milhões por mês.
Entenda as acusações de fraude que levaram a Shefa à falência
‘Valorização do ativo’
A nova gestora judicial da Agropecuária Tuiuti se manifestou na última sexta-feira (14) pela primeira vez desde que a empresa teve a falência decretada.
“A decisão judicial permite a melhor preservação e valorização do ativo, com a finalidade de otimização de uma via de saída que permita prestigiar, na melhor extensão possível, a todos os stakeholders, conservando as relações de emprego, os contratos, o recolhimento de impostos e demais reflexos sociais relevantes”, diz nota da gestora.
A atividade empresarial será mantida até a liquidação do bloco, como forma de preservar o emprego dos mais de 300 funcionários e para o benefício da coletividade dos credores. O juiz também determinou que nenhum contrato ou obrigação vinculado à Shefa seja suspenso.
Confira na íntegra o comunicado da nova gestora da Shefa:
“A decisão judicial proferida em 12 de julho de 2023, pela 1ª Vara Cível de Amparo, decretou a falência da companhia, mas também determinou a continuação das atividades empresariais, com a manutenção da vigência de todos os empregos e contratos, assim como a nomeação de uma Gestora Judicial, a FKConsulting.PRO (FK), representada pelo sócio-diretor Sr. Frank K. Migiyama, em substituição aos administradores da companhia.
Assim, as atividades da companhia foram integralmente mantidas pela decisão judicial, tendo a Gestora Judicial assumido a gestão da companhia. A decisão judicial permite a melhor preservação e valorização do ativo, com a finalidade de otimização de uma via de saída que permita prestigiar, na melhor extensão possível, a todos os stakeholders, conservando as relações de emprego, os contratos, o recolhimento de impostos e demais reflexos sociais relevantes.”
Acusações de fraudes
Acusações de fraudes durante o processo de recuperação judicial levaram o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) a decretar a falência da Shefa.
O g1 obteve acesso à decisão de falência, na qual o juiz Fernando Leonardi Campanella, da 1ª Vara do Foro de Amparo, detalhou os indícios de fraudes relacionados à empresa.
Segundo Campanella, em 2015, a Shefa já vivia dificuldades financeiras. Foi então que um empresário começou a injetar capital na empresa e ganhou como garantia a posse da marca.
No ano seguinte, a venda da Shefa foi oficializada a um terceiro, mas com duas empresas do empresário que injetava o capital como “garantidoras” das obrigações assumidas pelo comprador. Uma delas também era credora da Shefa.
Pouco tempo depois da venda, de acordo com o magistrado, houve o primeiro indício de fraude. O então dono teria prestado garantias em prol da empresa garantidora/credora, de modo a abranger dívidas passadas no valor de R$ 35 milhões, o que seria ilegal.
“A concessão de garantias por dívidas contraídas anteriormente, sem dispor de bens livres e desembaraçados suficientes para saldar o passivo, é expressamente vedada”, diz trecho.
Outro indício apontado foi quando o dono reconheceu uma dívida no valor de R$ 14.556.389,80, a ser paga em 60 prestações de R$ 795.999,39. O parcelamento, com os juros, elevou a dívida para R$ 47.759.963,40.
“Ou seja, só de juros o dono da Shefa consentiu que sua empresa pagasse 228% a mais em relação ao montante da dívida existente”, afirma.
Por fim, em outra confissão de dívida, o proprietário teria dado como garantia à credora e garantidora a “Fazenda São Francisco”, imóvel onde está instalada a sede da empresa em Amparo.
“Observando-se que as finanças da empresa Shefa caminhavam mal e antevendo futuro pedido de recuperação judicial, buscou-se proteger o referido bem de raiz, de elevado valor de mercado e possível arrecadação naquele pedido de recuperação”, cita o juiz.
O que concluiu o juiz?
De acordo com a Justiça, o empresário garantidor/credor se relacionou ao processo de compra da Shefa para atuar na empresa e, ao mesmo tempo, beneficiar-se como credor. Veja os pontos destacados pelo juiz Fernando Leonardi Campanella:
O então dono nunca foi, de fato, o acionista controlador da recuperanda, atuando como verdadeiro “laranja”, visando assegurar interesses de terceiros, contrários aos da “sua” própria empresa, futura recuperanda;
a empresa credora não exercia, na prática, atividade predominante de fomento em prol da recuperanda, mas, sim, atividade voltada a gerar lucros por meio de empréstimos disfarçados e controlava a recuperanda, sua devedora;
as confissões de dívidas e instituições de garantias não tinham por escopo salvaguardar interesses da recuperanda, mas, sim, aqueles exclusivamente de credores vinculados ao garantidor.
“Sem dúvidas, houve abuso de direito e quebra do dever de boa-fé objetiva, ao transmitir ao Poder Judiciário, num primeiro momento, por meio do presente pedido de recuperação judicial, a busca por ajuda; um alento para equilibrar finanças e organizar dívidas desenfreadas, quando, em verdade, o verdadeiro escopo era fraudar credores”, destacou Campanella.
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